Bom dia, a todos!
Afeto Domesticado: Amor sem dor
Em 2003 Zygmunt Bauman já refletia sobre os laços na modernidade líquida e apontava para uma era em que os relacionamentos se tornariam frágeis, descartáveis, cada vez menos dispostos ao enfrentamento das dores e permanências. O que ele não previu foi a dissolução de vínculos que nem sequer chegam a se formar.
Antes, para iniciar um relacionamento amoroso, buscava-se uma amizade profunda, com uma conexão real e interesses em particular. Podia começar na escola, na igreja ou no trabalho. Depois de alguns encontros, ligações e, para os mais românticos, cartas, o namoro era oficializado. Se tudo corresse bem, o casamento era certo. Hoje, na pós-pandemia, se um casal sente atração — normalmente pelas redes sociais — trocam mensagens. Após algum tempo, saem e se tornam ficantes. Conhecem as famílias um do outro, viajam juntos, comemoram aniversários, mas cada qual entendendo seu lugar na vida um do outro. Na hora de apresentar para alguém, apresenta-o como amigo. Namorado(a)? Não, palavra muito forte, significa compromisso e traz a sensação de estar preso a alguém. E estar preso é ruim, te torna vulnerável e dá medo de acabar. Ser ficante — e até mesmo quando se sobe para o nível plus — significa viver o momento, não planejar o futuro e não sofrer se um dia acabar. Como acabar o que nunca começou? E para os que aceitam o título de namorado e decidem morar juntos: Esposo(a)? Não, palavra muito forte. Uma hora pode acabar, divórcio é burocrático e doloroso.
O mesmo vale para filhos. Criança dá trabalho, gera despesa, chora, cresce e segue um caminho que não podemos controlar. Melhor ser pai/mãe de pet. O animal se tornou objeto de consumo “eternamente fofo”, já que pode ser adestrado e seu comportamento no geral reflete a do seu tutor. Claro, não são tão eternos assim, mas isso também se resolve com empalhamento ou uma jóia com as cinzas de seu bebê.
Se ter um pet ainda for uma carga emocional pesada demais, pois ainda fica doente e tem a vida mais curta, o melhor é ter um bebê. Um filho que não chora, não adoece e o melhor: nunca cresce. Os bebês reborns têm sido febre nas plataformas digitais. Se antes surgiram com um brinquedo inocente para meninas e até mesmo objeto de e emocional para mães que tiveram perdas, hoje já têm outra utilidade.
E assim entramos nessa nova era, buscando relacionamentos que nunca findam e em constante fuga da dor. A afetividade ou a ser domesticada, programada para não confrontar, não envelhecer, não terminar. Assim, a profecia de Bauman ganha um novo desdobramento: os laços já não são apenas líquidos, tornaram-se sintéticos, modelados para parecerem reais, mas desprovidos de alteridade, confronto e fim. Amar, nesse contexto, é manter o controle, não abrir espaço para a transformação mútua.
E a pergunta que não quer calar é: qual o próximo avanço que humanidade terá?









































































































































































